Uma semana antes de me mudar para Buenos Aires vim à capital portenha a fim de resolver alguns trâmites burocráticos e participar do meu primeiro dia de aula. Foi a solução que encontrei para não perder minha vaga no mestrado depois de ficar sabendo com menos de uma semana de antecedência que havia sido aceita na universidade e que as aulas começavam imediatamente. Fiquei dois dias por aqui e regressei a Porto Alegre para organizar minha vinda definitiva.
Mesmo sabendo que o aeroporto Salgado Filho está quase sempre fechado para pousos e/ou decolagens nas manhãs de outono e inverno, os preços das passagens me fizeram optar por deixar Buenos Aires às 7h25min da manhã. Chegando ao aeroporto Ministro Pistarini, mais conhecido como aeroporto de Ezeiza, fiz o check in e fiquei dando voltas, esperando a hora passar. Nesse meio tempo, um casal puxou assunto comigo e conversamos alguns bons minutos.
Eles moram numa ilha “perto” de Belém. Digo “perto” (entre aspas) porque para chegar até a ilha onde eles moram leva uns quatro ou cinco dias de barco partindo da capital paraense. Tinham chegado a Buenos Aires há alguns dias. Estavam a caminho do Chile, onde o homem havia recebido uma proposta para trabalhar em algo que no meio da conversa escapou-me a resposta. Chegaram à capital portenha pelo terminal de ônibus de Retiro, o que me pareceu estranho pelo fato de eles morarem num lugar que fica demasiado longe para viajar de ônibus até a Argentina. As justificativas também se perderam diante do pouco tempo que tinha para entrar na sala de embarque e diante do excesso de informações surpreendentes sendo contadas e escutadas praticamente de madrugada depois de uma noite mal dormida minha e várias deles. Eles foram assaltados logo nos seus primeiros minutos aqui. Levaram todo o dinheiro que tinham, documento, visto de entrada no país e, inclusive, o contato que tinham da pessoa que havia feito a proposta de trabalho no Chile.
Fizeram o que qualquer um nesta situação faria: recorreram à embaixada brasileira, que não demonstrou o menor interesse em ajudá-los. Disseram-lhes que podiam dar-lhes uma autorização para saírem do país (necessária já que tinham perdido o comprovante de entrada na Argentina), mas que teriam que esperar entre 60 e 90 dias para que o Itamaraty avaliasse a situação do casal e lhes conseguisse passagem de volta. A solução mais rápida que lhes ofereceram foi levá-los até Uruguaiana, cidade gaúcha que faz fronteira com a argentina Paso de Los Libres. De que adiantaria encaminhar duas pessoas que não tinham um centavo sequer no bolso para uma cidade que está localizada no ponto extremo oposto de onde vivem, ainda mais se tratando do Brasil que é um país enorme?
Então, com a autorização para deixar a Argentina em mãos, eles deram um jeito de ir para o aeroporto (que fica a quase 50 quilômetros do centro da cidade) para tentar conseguir uma passagem de volta para Belém diretamente nas companhias aéreas. A sorte que tiveram depois de tantos azares é que conheceram um senhor que tinha milhas acumuladas no cartão e decidiu usá-las para adquirir as passagens de volta do casal. Mas a história não acabaria aí, pois, quando chegassem a Belém, teriam que ter guardado ainda um punhado de sorte, pois precisariam conseguir uma passagem de barco até a ilha onde moram.
A empreitada no aeroporto levou dias. A mulher, que estava grávida, teve uma hemorragia e tiveram que retirá-la da sala de embarque para levá-la ao hospital. Saindo da sala de embarque, a regra diz que é preciso pagar novamente a taxa de embarque. Mais uma luta para sair dessa, conseguir lugar em outro vôo sem pagar taxa extra e procurar comida para agüentar mais algumas horas. Segundo me contaram, conseguiram alimentação com a empresa aérea. Quando os encontrei, por volta das 6h da manhã, tinham ainda que esperar no aeroporto até cerca das 21h, quando partia seu vôo.
O fim da história está longe do meu conhecimento, assim como os detalhes que se perderam no meio da rápida conversa. Às vezes ficou me perguntando se o casal conseguiu chegar de volta ao ponto de partida dessa indiada, já que ao seu destino jamais conseguiriam. Ganharam a oportunidade de sair de um lugar de onde talvez jamais imaginariam sair, para conhecer e trabalhar em lugares onde provavelmente jamais imaginariam que estariam e, por fim, não conseguem fazer nenhuma das coisas que pareciam estar a pouca distância de seu alcance. E a embaixada? Bom... sabemos que se os dois estivessem de terno e gravata embarcariam no primeiro vôo que partisse de Buenos Aires com destino a sua cidade de origem.
2 comentários:
Bom ponto, Aline. Triste história. Os caminhos da vida são sempre surpreendentes. Tomara que tenham encontrado um destino menos inglório. Tomara...
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